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Numa noite de domingo fui assistir uma celebração, um tributo de amigos e artistas a uma nonagenária que morrera de forma trágica e só então tivera desvendada uma vida cheia de aventuras e charme.
Pensava nessas homenagens tardias e no ator, diretor e produtor Anselmo Duarte que morrera aos 89 anos de idade.
Ele faz parte das minhas lembranças acompanhando as filmagens de “A Madona de Cedro”, de Carlos Coimbra, em Congonhas do Campo, graças ao Padre Massote, da Escola Superior de Cinema da Universidade Católica que emprestara duas câmeras “modernas” Arriflex para a produção. Isso nos idos de 68...Baseado na obra homônima de Antonio Callado, o filme conta a história de Delfino, um homem pacato que vive em Congonhas do Campo, pequena e histórica cidade no estado de Minas Gerais. Mas, instigado pelos amigos, ele é levado a roubar de uma igreja a imagem Madona de Cedro, um valiosa escultura do século 18 esculpida por Aleijadinho.
Carlos Coimbra, que não era meu parente, foi um artesão, tentando fazer um cinema popular, sem grandes preocupações com a atualização da linguagem cinematográfica. A antítese do cinema novo...
Mas “A Madona de Cedro” era uma grande produção, com um elenco formado por Leonardo Villar, Leila Diniz, Anselmo Duarte, Sérgio Cardoso, Cleyde Yáconis, Jofre Soares, Leonor Navarro, Américo Taricano e Zbigniew Ziembinski. O mais fino da dramaturgia brasileira e a melhor equipe técnica. Quase todos já estrelando filmes nos céus...
Nas vezes que recontei histórias desse episódio me fixei na paixão de Leila Diniz pelo violonista Toquinho e que atrasavam o cronograma de filmagens quando os dois se trancavam por um final de semana em um apartamento do hotel, por ser mais interessante e charmosa.
Andando por todas as locações das filmagens, sempre ao lado de Aníbal Massaini, então um jovem produtor, encontrávamos com o co-produtor e ator Anselmo Duarte, simpático e falante.
Ele que conquistara a Palma de Ouro, em Cannes, com “O pagador de promessas” gostava de dizer que inventara o Cinema Novo, quando seus desafetos diziam que só ganhara de “O anjo exterminador”, de Buñuel, graças aos interesses da Motion Pictures..
Mas, Gláuber Rocha, guru do cinema brasileiro, era seu amigo, confidente e admirador...
Contava histórias e mais histórias, suas façanhas do passado, sonhando com os filmes que ainda realizaria, ele que era um ícone do cinema brasileiro, desde o tempo que ajudava o irmão Alfredo, projecionista de Salto, no interior de São Paulo, passando pelos inúmeros papéis de galã na Atlândida...
Como ator, tem um outro grande desempenho em “O caso dos Irmãos Naves”, em que faz o papel de um violento tenente da polícia mineira, dirigido por Luís Sérgio Person, que era uma “avis rara” do cinema novo em São Paulo.
A vida aventurosa de Anselmo Duarte começou com sua ida para o Rio de Janeiro, em 1942, atraído por um anúncio de jornal do diretor Orson Welles selecionando pessoas para participar do filme “It's All True”, uma lenda e que não foi finalizado, mas marca então a sua estréia no cinema.
E como um bom filme com começo, meio e fim sua história termina onde tudo começou.
Breve, tenho certeza, teremos uma enxurrada de obras sobre Anselmo Duarte nas livrarias e na “telinha”...
Mas, continuo a pensar que todas as homenagens deveriam ser em vida...
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