Pedro Coimbra
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Minha avó Nair nasceu na Vila de Nepomuceno, pertinho de Lavras, filha de “sá” Donana e de “seu” João Barbosa, boticário, caçador de codornas, político, jornalista e amante das artes que viajava a cavalo para o Rio de Janeiro para se inteirar das novidades.
Não se sabe bem por que se casou com meu avô Pedro Coimbra, um alfaiate vindo de Tiradentes, cuja família era praticamente desconhecida por essas bandas.
Lembro-me bem, menino ainda, de folhear um álbum de fotografias junto com minha mãe e ver Dona Nair, muito linda, numa pose costumeira para os fotógrafos da época..
Foi uma mulher bonita, eu tenha certeza e nunca deixou de prender os cabelos curtos de uma maneira bem charmosa.
Quando a conheci a família já tinha sido vitimada pela fatídica “Roda da Fortuna”, com o pagamento de um famigerado aval para um rico fazendeiro, confiando no fio do bigode, como se dizia, pelo meu avô e moravam numa casa simples na rua Babosa Lima que fora residência do seu motorista.
Uma rua de terra ora muito enlameada no tempo das águas, ora com uma poeira vermelha que grudava na pele, na seca e que só tomaria ares mais civilizados anos depois quando meu pai, Renato, calçou a cara de uma família pessedista e pediu ao prefeito udenista, Nadinho, que a pavimentasse, o que foi feito.
Mas, Dona Nair enfrentou com altivez essas agruras todas e levou a vida como Deus queria e como as circunstâncias permitiam.
Adorava orquídeas e no seu quintal mantinha em uma mangueira duas ou três espécies que certamente não eram raras de Cattleias, Vandas, Phalaenopsis ou Cymbidiuns, mas singelas bailarinas amarelas, as Oncidium Zappi, que nos mostrava sorridente quando floriam.
No espaço que controlava e que não era muito grande, havia de tudo um pouco: “boca-de-leão”, crisântemos, girassóis, “palmas-de-santa-rita”, lírios, margaridas, violetas e avencas, sem contar aquelas que se perderam na minha memória.
No terreno vazio acima de sua casa e que mais tarde meu pai compraria havia um cerca tosca, vedada por beijos rosados.
Como seus maiores divertimentos eram bater perna, quando meu avô permitia, e conversar com as pessoas, amigas ou não, quando elas faltavam dialogava com as suas plantinhas.
Vaidosa mesmo na simplicidade, nunca a vi sair para a rua sem antes passar um ruge rosa, colorindo as maçãs do rosto, leite de colônia na pele, prendendo os cabelos com ramonas, presilhas e depois lançando mão de uma pequena bolsa e uma sombrinha para se proteger da chuva ou do sol.
No tempo que restava das tarefas domésticas sentava-se em uma cadeira de um conjunto de palhinha austríaca, que meu avô comprara quando casaram e fazia por horas a fio, crochê e o frivolité, com sua inseparável navete.
Devia gostar realmente de crianças, pela turminha que colocou no mundo e pelos netos, que zoavam pela casa e a quem sempre tolerou com muita paciência. Sua única preocupação é que não perturbássemos meu avô, “seu” Pedro Coimbra, naquela época já afetado pela caduquice e que passava o dia inteiro de ouvido colado no rádio, sintonizado na Rádio Nacional do Rio de Janeiro.
Sempre que penso nela sinto suas dificuldades para criar moças e moços num tempo em que não existia um emprego decente por toda a cidade.
Não há provas do que vou escrever a seguir e nunca foram encontradas anotações e vestígios que pudessem comprovar tais sonhos, dentre os despojos encontrados depois de sua morte, mas tenho certeza que quando às escondidas fazia sua fezinha no jogo do bicho, pensava que no dia que ganhasse na cabeça e que então compraria um lindo colar de perolas, um anel de safira ou um bom perfume francês.
Por que, saiba meu caro leitor, as paixões femininas são eternas...
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