Pedro
Coimbra
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No
Skina 22 eu conversava com “Zorongo” que foi um dos primeiros a
rumar para São Paulo na década de 60. Jovens que mal
haviam terminado o Tiro de Guerra viraram bancários de uma
hora para a outra.
“Morávamos
num casarão, o ´Ninho das Águias`, em Moema”,
contava Mário “Zorongo” e lembrava-se de uma casinha,
parede e meia, onde morava um casalzinho. Aos sábados a moçada
não trabalhava e a mulher se exibia, vestindo um shortinho
muito curto e cavado que deixava todos alucinados.
“Ela
ouvia, ´Que queres tu de mim`, com Altemar Dutra”, lembrava
Mário. “Que queres tu de mim/Que fazes junto a mim/Se tudo
está perdido, amor”, e ele deixava os boêmios
estupefatos enquanto fazia melodrama e dizia que Evaldo Gouveia e
Jair Amorim eram gênios.
“Minha
mãe me enviou uma carta dizendo que meu pai fora preso pelos
milicos. Depois foi inocentado por um coronel em Juiz de Fora, mas já
perdera seu emprego público. Foi então que me demitiram
do banco”, contava “Zorongo”.
“Voltou
para casa?”, perguntei interessado naquela história.
“Zorongo”
pediu mais uma caipirinha e mais uma Brahma antes de responder.
“Que
nada! A casa caíra de vez. Meu velho saía bem cedinho,
com uma pasta de couro na mão, como se fosse trabalhar na sua
repartição e sentava-se numa mesa no Bar Pinguim. Bebia
cachaça com groselha o dia inteiro e voltava cambaleando. Sua
história de vida acabou. Morreu de cirrose”, contava com os
olhos cheios d água.
Muito
tempo depois Mário “Zorongo” foi para Belo Horizonte
procurar trabalho até que encontrou Antonieta, uma morena que
não era bonita, mas tinha pernas compridas, lindas. O pai dela
era gerente de uma empresa de mineração e arranjou
emprego para o genro na mesa de open market de um banco.
“Verdadeiramente
só pensava em voltar para cá por que detestava Beagá.
Um dia fui para a rodoviária e peguei o primeiro ônibus.
Deixei para trás um amor e um bom emprego. Tinha idéias
impossíveis de realizar com meu pequeno capital. E ouvia os
versos da música cantada por Altemar Dutra: ´Não
sei o que pedir/ Se tudo o que desejo é paz/Que culpa tenho
eu/ Se tudo se perdeu...”, cantarolava Mário “Zorongo”.
Devorávamos
um “Frango à Passarinho” enquanto ele dizia que um dia
encontrou em sua casa uma maquina de escrever Olivetti Lettera.
“Naquele
momento tive mais do que uma inspiração, uma
iluminação! As pequenas cidades não possuíam
jornais impressos. Não havia notícias locais.
Lembrei-me de um conhecido dono de uma gráfica em Juiz de
Fora. Fiz lá o número zero de um jornal modelo e saí
vendendo a idéia. Em pouco tempo eram mais de cinqüenta
locailidades e eu trabalhava até alta madrugada na redação
e depois levava para imprimir”, ele me dizia olhando o movimento
das mocinhas que passavam pela rua.
“Não
sei o que pedir/ Se tudo o que desejo é paz/ Que culpa tenho
eu/ Se tudo se perdeu”, falava Mário “Zorongo’. “De
repente cansei de tudo aquilo e viajei para São Paulo. O
`Ninho das Águias` tinha sido demolido e em seu lugar ergueram
um enorme prédio residencial. A casinha da moça de
shortinho também desaparecera. A maior parte dos que haviam
imigrado para lá voltara para casa. Todos, menos um, que
morrera num incêndio, do Joelma ou do Andraus, não me
lembro. Ouvia a música no ar. E eu estava ali e feliz da vida,
pois ela é feita de momentos...E tenho uma bela história
para contar ao lado de Antonieta, a mulher de lindas pernas”, disse
e cochilou por entre copos, maços de cigarros e garrafas
vazias...
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